A Balançar o Galho da Roseira

Autor: Edigles Guedes

Um estrondo pipocou tão ligeiro…
Foram fogos pra todos os lugares;
Explosão de bomba troou pelos ares.
Foi bala de canhão, voando maneiro;
Foi bala de trovão, no alvo certeiro.
A minha sogra caiu duma ladeira;
Estabacou-se o frosquete na feira.
De canastra para baixo ela caiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.

Uma fumaça amarela voou, voou.
Um grande tremor abalou essa terra,
E soou como a queda de enorme serra.
Velha tinha certeza que sonhou.
Será que o mundo mudo desabou?
Minha sogra ficou numa tonteira,
Espichou aquela cara de leseira,
O semblante da magrela descaiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.


Famílias ficam sobressaltadas;
De par em par, abrem brancas janelas.
Escondem as ventas nas suas baixelas.
Nos quartéis, com pernas amareladas,
Sentinelas bradam amarguradas.
Dizem que foi bufa de feiticeira;
Quem sabe, de velha catimbozeira.
Toda conjectura por terra caiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.

Cães aos pés de seus donos e senhores
Ladraram por medo nas sujas calças;
Abriram lares com malas sem alças.
Cães ficaram pelados de horrores.
Voaram as bufas de todas as cores.
Apagou-se o fogo duma lareira.
Minha sogra largou bruta coceira;
Seu chapéu-panamá sambou tanto e caiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.


O pipoqueiro assombrou-se, aperreado,
Nunca ouviu esse estouro desconcertante.
— Eta! papoco por demais prestante!
Nem sequer pipoca pula de lado,
Como um desmiolado cachorro acuado.
Eta! barulho surdo de bobeira!
Se eu contasse falavam que era asneira.
Da pia de roupa, o balde grave caiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.

Sapateiro põe a cabeça de fora.
Vê aquele rebuceteio, encolhe-se,
Que nem jabuti no casco sem prece.
— Quem quiser que fique eu vou-me embora.
Quem nasceu pra cangalha, nesse agora,
Não bota a cela, pela vida inteira.
A vida é dura canseira e pedreira,
Que martelo da morte bateu e caiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.


O quitandeiro bocejou bravura:
— Vou enfrentar esse “vento” sorrateiro.
Vou valentia ensinar ao seresteiro!
Ele fez aquela grave gravura;
E saiu pra livrar todos da apertura.
Carregava nas mãos paus e pedreira.
Da bufa, acertaria na cruel moleira.
O “vento” passou rasteira, ele caiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.

O feirante, bastante descontente,
Vociferou em demasia furibundo:
— Estou tiririca de fremebundo!
Assim, por causa da bufa insolente,
Perco as verduras e fico indolente.
Mas antes, dou-lhe com galho de aroeira!
Desfiro um bom murro na sua chaleira!
O feirante foi vencido e partiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.


A costureira deu seu sobressalto;
Sobrou-lhe tremendo e cruento embaraço.
A saia voou, as pernas caíram num laço.
A máquina de coser deu seu salto.
Alfinete e agulha navegam alto.
Bateu na costureira uma zonzeira.
Quedaram flores duma quixabeira.
A xícara, sobre a mesa, partiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.

O delegado, dali, interrogou:
— Que fuá foi que fiofó largou folote?
Que até uma fogo-apagou deu calote,
Bateu as botas, quando cheiro chegou.
Bolo da sogra no fogo estragou.
E o povo logo sofreu de canseira,
Com tapado som de bomba caseira,
Como trovão caceteiro que caiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.


O meu sogro, que zombeteando, disse:
— Seu delegado, aquilo não era nada.
Foi apenas o efeito da panelada.
Toda essa grande alcoviteirice
É do povo alheio, cheio de meninice.
Daquela gente sem eira nem beira,
Que merece um pontapé na traseira.
Eis que uma caçarola da pia caiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.

Meu sogro continuou seu depoimento:
— Tarde, comprou um fato de novilhote;
Cangote de preá, banda de garrote;
Meio quilo de lombinho, de toucinho.
Cozinhou, misturando com cominho.
Naquela noite, fumegou a chaleira;
As carnes escaldaram na caldeira.
A panelada no estômago caiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.


Por pouco, o zé-povinho não pensou
Que foi um cometa visitando a terra;
Que bradou bravamente pela serra.
Ou foi um cano d’água que rebentou,
Ou foi uma represa que palpitou,
Ou foi um joelho surrado da torneira.
Teve gente, que esbravejou, leseira:
— O mundo se acabou: o cometa caiu!
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.

A minha velha sogra foi quem disse:
— Ah! meu genro, eu sou querida e casada
Com homem de flatulência danada.
Que atirando ao chão, por peraltice;
Reboa estrondo com colossal chatice.
Pior do que torpedo numa banheira,
Pior do que pinguço numa saideira,
Pior do que tigela magra que caiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira. 


A minha velha sogra continuou
— Ah! meu genro, eu sofro tanto aperreio,
Que nem criança buchuda de permeio.
Certa feita, um gato acá pernoitou.
Ao despertar com o som, disparou.
Levantou fumaça nessa carreira.
Pense numa desmedida fogueira!
O gato topou com cachorro e caiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.

— O cachorro assustou-se sobremodo.
Correu desesperado a todo pano;
Até o momento em que entrou pelo cano.
Chocou-se com seu dono, quasímodo;
Que soltou um “vento” vulgar em êxodo.
Isso causou descomunal zoeira.
Daí, perdi minha paz tão costumeira.
Do armário desabou um bule e caiu.
— Foi barulho do meu sogro, que saiu
A balançar o galho da roseira.

— FIM —


Salgueiro, 4/2/2016.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

As Façanhas de Camonge

O Cavalo da Estrela de Ouro na Testa

A História de José e Maria